Poemas Tentados

21/ 05 /2023

Enquanto dormes

Enquanto dormes alguém te ronda e te cuida,

enquanto dormes alguém te observa e admira,

e sem desespero tenta adivinhar teus sonhos;

enquanto dormes alguém com cuidado te cobre

o peito no afã de dar-te conforto na cama;

enquanto dormes alguém te amacia de afeto;

enquanto dormes, enquanto dormes,

podes até sonhar com este manto breve

que te acompanha no clarão do dia

e te vela com alegria enquanto dormes.

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21/ 05 /2023

Delírio

Tu não sabes em quais rios me lançaste

ou em quantas águas me afundaste

sem piedade ou dó,

nem com quantos tiros me acertaste

e com quantos rombos me deixaste,

sequer me viste agonizando

por um pensar ainda leniente

que se esfriou amarguradamente

dentro duma mente que era tua,

que esvaiu frágil, despida e crua,

quando impuseste teu poderio,

depois que me afogaste no calado rio,

depois que me alvejaste no abafado tiro,

sobretudo indócil, retirante do querer,

profundo desvario, eu, metralhado e só.

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06/ 05 /2023

Sorrir e Chorar

Tristezas e vertigens

delas não podemos escapar

nem só de alegria a gente vive

vezes a sorrir, vezes a chorar.

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16/ 04 /2023

Instantes

O segundo apavora

quando nos espanta

e nos afugenta

o segundo é menta

a roçar na garganta

quando a dor aumenta

o segundo é chama

que instantes alimenta

na calma alarmante

o segundo apavora

se dissolve na hora

e nos violenta

com tanta coisa

que tínhamos

para fazer

e num segundo

a gente só tenta

tenta.

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02/ 04 /2023

Morada

Eu moro no meu silêncio de

estafa

estorvo

estopa

feitiço

cortiço

quebrado

passadiço

eu moro no meu silêncio de

estercos

traças

troças

trancas

atalhos

agitos

e me caibo

incompleto

empresto o chiado

arremesso a trombeta

e me encalço calado,

doído em depressão

emudecido parado

na metade da eternidade

que me advém

além donde moro

no meu silêncio de

espantos

espasmos

por

caibros que se quebram

cãibras que se enervam,

mas não vivo só de silêncios,

também remexo o argumento

e me arguo na confusão

ou no alvoroço do galpão

do pressentimento,

a depender da ocasião…

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19/ 03 /2023

Fuga Atroz

Fuga, fuga,

fuga de mim,

fuga de ti,

fuga de nós,

entre achados

e perdidos

deito torto

sem me ver,

sem me sentir,

fuga, fuga,

fuga cega,

pelas sombras

sobre os ombros

de quem carrega

o que não sobrou

no leva e traz

da intriga e da paz,

fuga de mim,

fuga de ti,

fuga de nós,

emudecer a voz

irreprimível do som

por um insular

tubo de ensaio

interior do íntimo

que corrói,

fuga, fuga,

fuga atroz.

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12/ 03 /2023

Monotonia

Monotonia, minha companheira

paciente, calma, indormida,

que me cuida como uma enfermeira

contra tensões obtusas da vida.

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26/ 02 /2023

Galopes urbanos

Galopes urbanos

da sobrevivência

no trote

no mote

no impulso

de balanços

e tremedeiras

danças arriscadas

jogadas incompletas

angústias pesadas

pedradas no viver

reagir

relutar

recorrer

galopes urbanos

deixam marcas

pelos canos

cubículos

círculos

espaços abertos

por onde resvalam

desilusões sonhadas

em meio a fenos

sob as estacadas

das cenas transfiguradas,

galopes urbanos.

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19/ 02 /2023

Dois instantes

Há um instante para cuidar

e um outro para relaxar

nas esquinas vagas do som,

no fragor de corpos unidos,

mãos dadas no fim da festa,

esboço de mil pegadas,

fruição em arte lírica

de uma canção longínqua,

há um instante neutro

para sobrepor-se sereno

e um outro conturbado,

para fazer travessuras

e afundar nas alturas

bem descuidado.

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19/ 02 /2023

Teorema

Ele faz graça

e ela nada diz

não sabe se ela

é poema

ou se é tema

querê-la

tão íngreme

querê-la

tão cheio

no útero

ela é poema

ela é tema

variante

diferente

calada

escalada

escaldante

à latere

ele numa cena

de drama

ou num suspense

de arranhões

não sabe se a procura

para uma nova jornada

sabe que é difícil

uma saída à vista

ela é teorema

ou uma maquete

ou um arquétipo

ou um barquete

ele sem emblema

procura a solução

numa terra molhada

caso ela venha a escorregar

para segurá-la nos braços

e não mais largar

num longo espaço

de sonho adoidado

sendo ela teorema

assim como uma

alma pedinte

que circunda o olhar

se porventura

por alguma fraqueza

ou necessidade dela

ele possa com delicadeza

seus ombros a ela ofertar.

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