Artigos - O Direito e as Novas Tecnologias da Informação e Comunicação

21/ 11 /2013

O Direito e as Novas Tecnologias da Informação e Comunicação

O processo brasileiro segue a tradição do direito continental europeu dando atenção total à segurança jurídica na condução das demandas. Mas, num país populoso, complexo e extenso como é o Brasil a prestação jurisdicional quase sempre deixou a desejar, motivo pelo qual, além da segurança, também se tornou prioridade resolver o problema da morosidade e sair da inércia e do formalismo para melhor atender ao consumidor dos serviços judiciais.

Duas ou três décadas atrás sequer se conhecia bem a informática e a existência de uma única máquina de escrever elétrica era um luxo num fórum. Quem primeiro ocupou o lugar de instrumento principal de registro e documentação dos atos processuais foi o papel escrito à mão, depois a máquina de escrever, pela qual o papel passou a ser datilografado formando os autos do processo. Mesmo na atualidade, o ambiente de trabalho ainda se concentra na maioria dos órgãos judiciais nos autos físicos decorrentes da juntada contínua do papel num serviço cartorário que herdamos do direito canônico medieval.

Até o início dos anos noventa era impensável uma mudança tecnológica na Justiça nos termos como se apresenta agora. Antes, o andamento das causas dependia basicamente da eficiência e do desempenho pessoal e manual dos serventuários e juízes. Em época anterior à globalização e à informatização, não havia mágica a realizar, a comunicação apresentava dificuldades próprias na aplicação dos métodos tradicionais e ainda usuais, tais como guarda dos autos físicos pelo escrivão em armários ou gavetas, publicação de atos em Diários Oficiais impressos e a presença imperiosa de um oficial de justiça para ir pessoalmente cumprir o mandado.

Inserido o computador na atividade jurídica brasileira, a partir da década de 90, eis o momento de se difundir, sem adiamento, o uso integral da internet e seus benefícios a todas as comarcas e setores judiciais. É isso o que está acontecendo, conforme se pode notar das atuais metas e experiências de trabalho de diversos tribunais brasileiros.

O Superior Tribunal de Justiça informatizou os recursos e processos naquela Corte. Essa iniciativa desafiadora foi seguida e até precedida por diversos tribunais do País, alguns dos quais já contando com experiência de informatização judicial.

Ao tornar eletrônico os seus recursos especiais o Superior Tribunal de Justiça indiretamente leva à mesma iniciativa aos tribunais e juízos, federais e estaduais, para viabilizar e uniformizar o processamento de recursos. Também esta é a pretensão do Conselho Nacional de Justiça, que se mobiliza para implantação de um sistema nacional de informatização entre todos os tribunais do país.

O Judiciário aos poucos se dá conta de que as novidades tecnológicas mudarão completamente a prática processual brasileira, hoje menos arcaica, conquanto ainda dificultosa.

A digitalização afeta a forma de trabalho e a maneira de agir dos juízes, servidores, ministério público e advogados. A documentação e a comunicação pelos autos físicos (em papel) passam a ter uma função secundária, pois o ambiente eletrônico toma lugar de destaque. Partes e advogados podem via internet, de qualquer lugar do país e até do exterior, e a qualquer hora ou dia, ter dados da sua causa. Passa a ser desnecessário o deslocamento dos advogados, por exemplo, de alguns Estados para Brasília ou do interior para a capital de um Estado, a fim de fazer postulações ou acompanhamento presencial de processos, representando economia no bolso do cidadão.

Naturalmente, para se alcançar o resultado desejado, ainda falta bastante investimento em tecnologia e aperfeiçoamento da informática judicial. Até agora, nas varas em que já se implantou o processo eletrônico, como nas de execução fiscal e de juizados especiais, o princípio da publicidade ainda não pode ser cumprido completamente, porque ainda existem milhões de brasileiros sem acesso à internet, o que dificulta o uso geral de tal ferramenta. E surgem de vez em quando problemas técnicos, como lentidão e dificuldades para o interessado ter acesso e saber a fase ou o resultado de seu processo.

Contudo, inevitavelmente a justiça virtual é um caminho sem volta. Os autos em papel se queimam aos poucos pela chama do progresso tecnológico, como ocorreu com os registros de atos judiciais feitos à mão, à caneta, esta substituída pela máquina de datilografia. Os ritos devem ser praticados e os Códigos devem ser lidos, interpretados e adequados em compasso com essa nova realidade.

Não se trata, porém, de uma revolução, mas de uma evolução. É que as coisas não acontecem assim como um nocaute. É preciso investir mais em tecnologia e em informática, é preciso preparar os operadores do direito para o uso da ferramenta, é preciso convencê-los dos benefícios dessa nova forma de trabalho e também é preciso prática e convivência com o ambiente informatizado para se reparar eventuais pontos negativos do sistema.

Os efeitos da concretização dessas metas, sem dúvida alguma, serão extensos. Contribuirão para a corrida contra o passivo de processos ainda não julgados e contra a demora marginal das demandas e, enfim, apresentarão grandes resultados.

O processo virtual é virtuoso para a Justiça brasileira, portanto, repita-se, trata-se de uma realidade irreversível.

 

* Vallisney de Souza Oliveira – VSO. Publicado tb. na Revista Jurídica Consulex n. 308, 15 novembro de 2009, p. 27. Ed. Consulex.

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