Palestras - Palestra 8

20/ 07 /2015

Palestra 8

Litigância de Má-fé*

Senhora Coordenadora do Curso de Direito, Professora Heloísa Simonetti, agradeço imensamente o convite para falar sobre Direito Processual ao lado do brilhante tributarista e Procurador do Estado, o professor Carlos Alberto Ramos.

Para se almejar um processo équo e satisfatório é pré-requisito a atuação dos sujeitos processuais de acordo com a ética, a lealdade e a boa-fé. É necessário ainda que os contendores saibam que a função maior do operador jurídico é com a Justiça e com o Direito e não com interesses particulares ou estatais.

Ser leal implica seguir princípios e respeitar as pessoas com quem se relaciona; ser servo da honradez e da sinceridade. Significa ser franco, não ser traiçoeiro, entre outros deveres morais necessários à boa convivência.

Estar de boa-fé implica atuar com a verdade, ser crente na justiça, ser fiel aos princípios e nos valores nos quais se acredita.

A boa-fé não tolera dissimulações. Cuida-se de uma crença naquilo que se crê, conquanto possa haver equívocos na apreciação e na valoração do juízo.

No Direito Processual travou-se uma conhecida polêmica entre James Goldsmith e de Oskar Von Büllow, no Século XIX, acerca da natureza do processo. Ao final, prevaleceu a posição deste último, para quem o processo consistia numa relação entre o juiz e as partes, repleta de faculdades, deveres, poderes.

Apesar da doutrina da relação processual, liderada por Büllow, ter-se estabelecido durante séculos, não se pode menosprezar a posição de Goldsmith, que mostrou também outra realidade, ao afirmar que o processo consistira numa situação jurídica, na qual as partes tinham o ônus de participar ativamente ou passivamente, sujeitando-se ao insucesso ou sucesso no resultado da demanda tudo a depender de um agir ou de um não agir.

Em meio a essa discussão é do espanhol James Guasp a compreensão do processo como o conjunto de finalidades perseguidas pelo juiz e pelas partes a fim de prevaleça e se obtenha a justiça.

Assim, o processo era visto como um conjunto de deveres para Büllow, como ônus para Goldsmith e como um feixe de regras de boa-fé para Guasp. São luzes sobre o mesmo fenômeno, que mostram a natureza multifacetária do processo, que não pode deixar de ser fundado na ética.

O nosso Código de Processo Civil é também informado pelos ônus da parte. O ônus de contestar, de pedir uma prova, de recorrer, de nomear bens à penhora. Mas também o nosso CPC contempla os deveres e os poderes do juiz e das partes, vinculadas também ao procedimento com licitude.

Em outras épocas o processo era fundado na religião e por isso mesmo a boa-fé lhe era inerente juntamente com a crença nos Deuses e nos mitos. A palavra tinha considerável valor. O juramento possuía um preço sem igual, inclusive com a possibilidade de que alguém, como um bispo ou pessoa importante no ambiente social ou econômico falasse em lugar de outrem ou se comprometesse em favor de uma das partes. Isso dava uma presunção de juridicidade às palavras daquele que se dispusesse a intervir a favor de um contendor judicial. O juramento ou depoimento pelo autor ou pelo réu levava o juiz considerar a qualidade ou autoridade do juramentista: se era clérigo ou nobre, por exemplo, sem se preocupar com o teor ou a veracidade do depoimento.

Na época atual o juramento não tem importância, como regra. Aliás, conta um escritor do Rio Grande do Norte que uma senhora bastante idosa foi depor em juízo e começou a mentir impulsivamente. Quando o juiz percebeu a mentira, admoestou-a e fez com que aquela senhora ficasse de pé, pusesse a mão em cima de uma bíblia e prestasse o juramento de dizer a verdade e somente a verdade. De imediato a anciã retrucou: Doutor agora com esse juramento a história que eu contei é outra!

Da fase do juramento, ainda na Idade Média, o processo seguiu regido pela força. Admitia-se o duelo ou a luta entre os litigantes, tanto que se a parte era fraca podia chamar um campeão para lutar na arena em seu lugar e em seu benefício.

Entretanto, na Idade Moderna a luta deu lugar à razão, para o mal e para o bem.

Com o advento do liberalismo, em decorrência da revolução francesa, passou-se para um processo no qual nada valia a palavra afiançada, diante do mecanismo do jogo de palavras, o que deu azo ao abandono da boa-fé e em seu lugar a má prática da deslealdade.

Na época contemporânea voltou-se para a busca desse ideal de justiça, com a repulsa aos artifícios maliciosos que encobrem a verdade.

No nosso direito brasileiro, no sistema das ordenações, a doutrina da época anota casos de chicana dos advogados, dos leguleios, dos golpes de mestre para ludibriar o juiz ou para não cumprir ordens judiciais, estendendo por décadas o processo.

Hoje os Códigos de quase todos os países procuram com intensidade mecanismos mais eficazes para combater a má-fé. Vejam, por exemplo, o Código de Processo Civil Alemão (ZPO), o CPC Italiano e CPC Português.

O ilícito processual viola não somente o direito das partes, mas a própria jurisdição e o ideal de justiça, que deve ser postulado com respeito e seriedade.

O Direito brasileiro possui regras peculiares quanto ao assunto, pelo fato de prever os deveres de todos os participantes do processo, bem como pelo fato de cominar sanções contra a falta de ética.

Os deveres das partes estão dispostos em vários dispositivos do Código de Processo Civil.

O juiz pode sofrer sanções civis, se agir com deliberada má-fé ou com dolo.

O Ministério Público pode ser parte, autor ou réu, e como participante do processo se sujeita também às sanções processuais.

O advogado possui o dever de defender uma causa sem atropelar as regras de conduta profissional, sob pena de vir a sofrer sanções, inclusive aquelas fundadas no Estatuto da OAB.

Os deveres éticos centram-se na necessidade de um debate justo, sem falsidades, sem solércia, prevendo-se consequências processuais para aquele que desrespeita o mínimo de boa conduta judicial e com isso causa prejuízo ao interesse público.

Do juiz se exige que desempenhe sua função magistral com isenção e comprometimento com a verdade, não com ilusões ou farsas, porque assim servirá à sociedade, ao Direito e à finalidade da jurisdição, que é a paz social.

As condutas das partes também não podem estar em desacordo com a moralidade. A luta na arena processual possui regras próprias e a desobediência ao devido processo com o fim de obter outro resultado que não seja uma busca segura da Justiça, sobretudo porque resultados desonestos e falsos devem ser evitados por serem deletérios.

A obediência ao princípio da lealdade e da boa-fé tem sua razão de ser na necessidade de que a sentença seja formulada em consonância com o direito e com o conflito de interesses real.

Devem ser rechaçadas surpresas prejudiciais e espertezas simuladas. Deve haver também a garantia de que o juiz agirá com responsabilidade e sem condutas arbitrárias e obscuras.

Em caso de conluio entre ambas as partes para fins ilegítimos, o juiz dará sentença de acordo com o princípio da boa-fé processual. Não estará adstrito ao pedido das partes. Desapreciando na sentença de mérito o pedido dos litigantes, poderá dar solução diferente da pedida e da defendida, desde que necessárias para evitar o abuso das partes, em homenagem à boa-fé processual.

Às vezes a parte pede e outras vezes o juiz concede de ofício a pena ao litigante de má-fé.

Como geralmente nenhuma das partes tem interesse em apontar a má-fé, porquanto a prática simulada ou dolosa se estabelece entre autor e réu, fica aberta a possibilidade de julgamento que obste o desejo das partes.

Segundo a Lei Processual são deveres dos litigantes e de todos aqueles que de qualquer forma participam do processo: cumprir com exatidão os provimentos mandamentais e não criar embaraços à efetivação de provimentos judiciais, de natureza antecipatória ou final. Mas os advogados se sujeitam exclusivamente aos estatutos da OAB, portanto a obrigatoriedade de se dar cumprimento a ordens judiciais não é direcionada a esse profissional e sim à parte que o contratou.

Sem prejuízo das sanções criminais, civis e processuais cabíveis, o juiz pode sancionar o responsável com uma multa em montante a ser fixado de acordo com a gravidade da conduta.

O que o legislador quer é coibir a falta de ética das partes na atividade judiciária, embora a sanção pecuniária não possa estender-se ao advogado, que se sujeita à sanção do seu órgão de classe, isto é, o Conselho de Ética da Ordem dos Advogados do Brasil ou de uma das suas Seccionais.

Mas como todos sabem a parte é representada nos autos pelo seu advogado e não é parte que pratica atos diretamente, em regra. Portanto, não deve deixar de ser considerada a possibilidade de que as condutas reprováveis sejam praticadas também pelo advogado, sem conhecimento do seu constituinte inclusive.

Em suma, aos advogados não podem ser aplicadas multas judiciais por descumprimento de decisão judiciária, sejam eles públicos ou privados, mas se sujeitam ao Código de Ética da OAB.

Outra questão relacionada à aplicação da multa ao Poder Público é quando o autor e o réu se fundem na mesma pessoa, como é o caso da União em juízo, numa verdadeira confusão processual.  Comprovada a recalcitrância de um funcionário, nada impede que o juiz aplica a multa a esse servidor, desde que a decisão sancionadora seja motivada.

Em relação à má-fé, de ofício ou mediante requerimento, o juiz pode aplicar a multa e, ainda, a condenação de indenização à parte contrária pelos prejuízos eventualmente sofridos por ela.

A multa e a indenização à parte contrária possuem natureza processual e podem ser impostas tanto ao autor, quanto ao réu. Mesmo a indenização à parte contrária, conquanto haja um acréscimo no comando da sentença (condenação das despesas gastas em virtude da atitude reprovável do outro demandante), apto a influenciar no direito material do litigante, sua causa e origem é processual.

A multa concedida na tutela específica de obrigação de fazer ou de entrega de coisa não se confunde com a multa aplicada em decorrência da responsabilidade da parte por dano processual e em razão da litigância de má-fé. Aquela se relaciona com o pedido e está a serviço do cumprimento do pedido, esta tem cunho exclusivamente processual, pois visa combater condutas, fins e atos antijurídicos.

A litigância dolosa se sujeita ao reconhecimento de ofício pelo juiz, em razão do comportamento contrário ao direito processual e à ética, não somente por parte do autor, mas também por parte do réu.

Independentemente de pedido do autor, do réu ou do Ministério Público, quando parte ou custos legis, a condenação ao litigante de má-fé pode ser aplicada de ofício pelo juiz, com a necessária fundamentação do ato decisório.

O pedido de indenização à parte contrária pode ser feito na petição inicial, mesmo porque o autor não tem ainda condições de prever a necessidade de indenização por futuras condutas do réu. É o processo a sede própria para o juiz poder aferir e observar a atitude dolosa e o prejuízo causado à parte contrária, conquanto a condenação à indenização constitua título executivo em favor do outro litigante. O título executivo foi gerado por um acontecimento havido no curso, e não antes ou

LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ*

Vallisney de Souza Oliveira

 

 

Senhora Coordenadora do Curso de Direito, Professora Heloísa Simonetti, agradeço imensamente o convite para falar sobre Direito Processual ao lado do brilhante tributarista e Procurador do Estado, o professor Carlos Alberto Ramos.

Para se almejar um processo équo e satisfatório é pré-requisito a atuação dos sujeitos processuais de acordo com a ética, a lealdade e a boa-fé. É necessário ainda que os contendores saibam que a função maior do operador jurídico é com a Justiça e com o Direito e não com interesses particulares ou estatais.

Ser leal implica seguir princípios e respeitar as pessoas com quem se relaciona; ser servo da honradez e da sinceridade. Significa ser franco, não ser traiçoeiro, entre outros deveres morais necessários à boa convivência.

Estar de boa-fé implica atuar com a verdade, ser crente na justiça, ser fiel aos princípios e nos valores nos quais se acredita.

A boa-fé não tolera dissimulações. Cuida-se de uma crença naquilo que se crê, conquanto possa haver equívocos na apreciação e na valoração do juízo.

No Direito Processual travou-se uma conhecida polêmica entre James Goldsmith e de Oskar Von Büllow, no Século XIX, acerca da natureza do processo. Ao final, prevaleceu a posição deste último, para quem o processo consistia numa relação entre o juiz e as partes, repleta de faculdades, deveres, poderes.

Apesar da doutrina da relação processual, liderada por Büllow, ter-se estabelecido durante séculos, não se pode menosprezar a posição de Goldsmith, que mostrou também outra realidade, ao afirmar que o processo consistira numa situação jurídica, na qual as partes tinham o ônus de participar ativamente ou passivamente, sujeitando-se ao insucesso ou sucesso no resultado da demanda tudo a depender de um agir ou de um não agir.

Em meio a essa discussão é do espanhol James Guasp a compreensão do processo como o conjunto de finalidades perseguidas pelo juiz e pelas partes a fim de prevaleça e se obtenha a justiça.

Assim, o processo era visto como um conjunto de deveres para Büllow, como ônus para Goldsmith e como um feixe de regras de boa-fé para Guasp. São luzes sobre o mesmo fenômeno, que mostram a natureza multifacetária do processo, que não pode deixar de ser fundado na ética.

O nosso Código de Processo Civil é também informado pelos ônus da parte. O ônus de contestar, de pedir uma prova, de recorrer, de nomear bens à penhora. Mas também o nosso CPC contempla os deveres e os poderes do juiz e das partes, vinculadas também ao procedimento com licitude.

Em outras épocas o processo era fundado na religião e por isso mesmo a boa-fé lhe era inerente juntamente com a crença nos Deuses e nos mitos. A palavra tinha considerável valor. O juramento possuía um preço sem igual, inclusive com a possibilidade de que alguém, como um bispo ou pessoa importante no ambiente social ou econômico falasse em lugar de outrem ou se comprometesse em favor de uma das partes. Isso dava uma presunção de juridicidade às palavras daquele que se dispusesse a intervir a favor de um contendor judicial. O juramento ou depoimento pelo autor ou pelo réu levava o juiz considerar a qualidade ou autoridade do juramentista: se era clérigo ou nobre, por exemplo, sem se preocupar com o teor ou a veracidade do depoimento.

Na época atual o juramento não tem importância, como regra. Aliás, conta um escritor do Rio Grande do Norte que uma senhora bastante idosa foi depor em juízo e começou a mentir impulsivamente. Quando o juiz percebeu a mentira, admoestou-a e fez com que aquela senhora ficasse de pé, pusesse a mão em cima de uma bíblia e prestasse o juramento de dizer a verdade e somente a verdade. De imediato a anciã retrucou: Doutor agora com esse juramento a história que eu contei é outra!

Da fase do juramento, ainda na Idade Média, o processo seguiu regido pela força. Admitia-se o duelo ou a luta entre os litigantes, tanto que se a parte era fraca podia chamar um campeão para lutar na arena em seu lugar e em seu benefício.

Entretanto, na Idade Moderna a luta deu lugar à razão, para o mal e para o bem.

Com o advento do liberalismo, em decorrência da revolução francesa, passou-se para um processo no qual nada valia a palavra afiançada, diante do mecanismo do jogo de palavras, o que deu azo ao abandono da boa-fé e em seu lugar a má prática da deslealdade.

Na época contemporânea voltou-se para a busca desse ideal de justiça, com a repulsa aos artifícios maliciosos que encobrem a verdade.

No nosso direito brasileiro, no sistema das ordenações, a doutrina da época anota casos de chicana dos advogados, dos leguleios, dos golpes de mestre para ludibriar o juiz ou para não cumprir ordens judiciais, estendendo por décadas o processo.

Hoje os Códigos de quase todos os países procuram com intensidade mecanismos mais eficazes para combater a má-fé. Vejam, por exemplo, o Código de Processo Civil Alemão (ZPO), o CPC Italiano e CPC Português.

O ilícito processual viola não somente o direito das partes, mas a própria jurisdição e o ideal de justiça, que deve ser postulado com respeito e seriedade.

O Direito brasileiro possui regras peculiares quanto ao assunto, pelo fato de prever os deveres de todos os participantes do processo, bem como pelo fato de cominar sanções contra a falta de ética.

Os deveres das partes estão dispostos em vários dispositivos do Código de Processo Civil.

O juiz pode sofrer sanções civis, se agir com deliberada má-fé ou com dolo.

O Ministério Público pode ser parte, autor ou réu, e como participante do processo se sujeita também às sanções processuais.

O advogado possui o dever de defender uma causa sem atropelar as regras de conduta profissional, sob pena de vir a sofrer sanções, inclusive aquelas fundadas no Estatuto da OAB.

Os deveres éticos centram-se na necessidade de um debate justo, sem falsidades, sem solércia, prevendo-se consequências processuais para aquele que desrespeita o mínimo de boa conduta judicial e com isso causa prejuízo ao interesse público.

Do juiz se exige que desempenhe sua função magistral com isenção e comprometimento com a verdade, não com ilusões ou farsas, porque assim servirá à sociedade, ao Direito e à finalidade da jurisdição, que é a paz social.

As condutas das partes também não podem estar em desacordo com a moralidade. A luta na arena processual possui regras próprias e a desobediência ao devido processo com o fim de obter outro resultado que não seja uma busca segura da Justiça, sobretudo porque resultados desonestos e falsos devem ser evitados por serem deletérios.

A obediência ao princípio da lealdade e da boa-fé tem sua razão de ser na necessidade de que a sentença seja formulada em consonância com o direito e com o conflito de interesses real.

Devem ser rechaçadas surpresas prejudiciais e espertezas simuladas. Deve haver também a garantia de que o juiz agirá com responsabilidade e sem condutas arbitrárias e obscuras.

Em caso de conluio entre ambas as partes para fins ilegítimos, o juiz dará sentença de acordo com o princípio da boa-fé processual. Não estará adstrito ao pedido das partes. Desapreciando na sentença de mérito o pedido dos litigantes, poderá dar solução diferente da pedida e da defendida, desde que necessárias para evitar o abuso das partes, em homenagem à boa-fé processual.

Às vezes a parte pede e outras vezes o juiz concede de ofício a pena ao litigante de má-fé.

Como geralmente nenhuma das partes tem interesse em apontar a má-fé, porquanto a prática simulada ou dolosa se estabelece entre autor e réu, fica aberta a possibilidade de julgamento que obste o desejo das partes.

Segundo a Lei Processual são deveres dos litigantes e de todos aqueles que de qualquer forma participam do processo: cumprir com exatidão os provimentos mandamentais e não criar embaraços à efetivação de provimentos judiciais, de natureza antecipatória ou final. Mas os advogados se sujeitam exclusivamente aos estatutos da OAB, portanto a obrigatoriedade de se dar cumprimento a ordens judiciais não é direcionada a esse profissional e sim à parte que o contratou.

Sem prejuízo das sanções criminais, civis e processuais cabíveis, o juiz pode sancionar o responsável com uma multa em montante a ser fixado de acordo com a gravidade da conduta.

O que o legislador quer é coibir a falta de ética das partes na atividade judiciária, embora a sanção pecuniária não possa estender-se ao advogado, que se sujeita à sanção do seu órgão de classe, isto é, o Conselho de Ética da Ordem dos Advogados do Brasil ou de uma das suas Seccionais.

Mas como todos sabem a parte é representada nos autos pelo seu advogado e não é parte que pratica atos diretamente, em regra. Portanto, não deve deixar de ser considerada a possibilidade de que as condutas reprováveis sejam praticadas também pelo advogado, sem conhecimento do seu constituinte inclusive.

Em suma, aos advogados não podem ser aplicadas multas judiciais por descumprimento de decisão judiciária, sejam eles públicos ou privados, mas se sujeitam ao Código de Ética da OAB.

Outra questão relacionada à aplicação da multa ao Poder Público é quando o autor e o réu se fundem na mesma pessoa, como é o caso da União em juízo, numa verdadeira confusão processual.  Comprovada a recalcitrância de um funcionário, nada impede que o juiz aplica a multa a esse servidor, desde que a decisão sancionadora seja motivada.

Em relação à má-fé, de ofício ou mediante requerimento, o juiz pode aplicar a multa e, ainda, a condenação de indenização à parte contrária pelos prejuízos eventualmente sofridos por ela.

A multa e a indenização à parte contrária possuem natureza processual e podem ser impostas tanto ao autor, quanto ao réu. Mesmo a indenização à parte contrária, conquanto haja um acréscimo no comando da sentença (condenação das despesas gastas em virtude da atitude reprovável do outro demandante), apto a influenciar no direito material do litigante, sua causa e origem é processual.

A multa concedida na tutela específica de obrigação de fazer ou de entrega de coisa não se confunde com a multa aplicada em decorrência da responsabilidade da parte por dano processual e em razão da litigância de má-fé. Aquela se relaciona com o pedido e está a serviço do cumprimento do pedido, esta tem cunho exclusivamente processual, pois visa combater condutas, fins e atos antijurídicos.

A litigância dolosa se sujeita ao reconhecimento de ofício pelo juiz, em razão do comportamento contrário ao direito processual e à ética, não somente por parte do autor, mas também por parte do réu.

Independentemente de pedido do autor, do réu ou do Ministério Público, quando parte ou custos legis, a condenação ao litigante de má-fé pode ser aplicada de ofício pelo juiz, com a necessária fundamentação do ato decisório.

O pedido de indenização à parte contrária pode ser feito na petição inicial, mesmo porque o autor não tem ainda condições de prever a necessidade de indenização por futuras condutas do réu. É o processo a sede própria para o juiz poder aferir e observar a atitude dolosa e o prejuízo causado à parte contrária, conquanto a condenação à indenização constitua título executivo em favor do outro litigante. O título executivo foi gerado por um acontecimento havido no curso, e não antes ou depois, do processo.

Ao aplicar a pena de litigante de má-fé ou de indenização, ao juiz não é consentido como regra deixar de julgar o pedido, pois uma coisa independe da outra.

Por outro lado, pela má-fé no processo o litigante estará sujeito à pena, a ser aplicada por sentença ou por decisão interlocutória, a pedido ou de ofício, e será cobrada após o trânsito em julgado.

Essas são algumas particularidades da má-fé no processo, conduta tão indesejável e sutil, quanto condenável, que requer às vezes profundidade cognitiva para se saber quando ocorreu de fato dolo ou apenas erro e quando é caso de exercício ou de abuso do direito de defesa.

O juiz deve velar sempre por um processo justo, o que lhe exige sempre atenção para reprimir atos atentatórios à dignidade da Justiça.

Encerro com a indagação de André Comte-Sponville, no seu Pequeno Tratado das Grandes Virtudes: “O que seria uma justiça de má-fé? Que seria um amor ou uma generosidade de má-fé? Já não seria justiça, nem amor, nem generosidade, a não ser que corrompidos à força de hipocrisia, de cegueira, de mentira”.

 

* Palestra proferida em Seminário promovido pelo Centro Integrado de Educação da Amazônia – CIESA (Coordenação do Curso de Direito). Manaus, 07.06.2003. OLIVEIRA, Vallisney de Souza.

depois, do processo.

Ao aplicar a pena de litigante de má-fé ou de indenização, ao juiz não é consentido como regra deixar de julgar o pedido, pois uma coisa independe da outra.

Por outro lado, pela má-fé no processo o litigante estará sujeito à pena, a ser aplicada por sentença ou por decisão interlocutória, a pedido ou de ofício, e será cobrada após o trânsito em julgado.

Essas são algumas particularidades da má-fé no processo, conduta tão indesejável e sutil, quanto condenável, que requer às vezes profundidade cognitiva para se saber quando ocorreu de fato dolo ou apenas erro e quando é caso de exercício ou de abuso do direito de defesa.

O juiz deve velar sempre por um processo justo, o que lhe exige sempre atenção para reprimir atos atentatórios à dignidade da Justiça.

Encerro com a indagação de André Comte-Sponville, no seu Pequeno Tratado das Grandes Virtudes: “O que seria uma justiça de má-fé? Que seria um amor ou uma generosidade de má-fé? Já não seria justiça, nem amor, nem generosidade, a não ser que corrompidos à força de hipocrisia, de cegueira, de mentira”.

 

* Vallisney de souza Oliveira. Palestra proferida em Seminário promovido pelo Centro Integrado de Educação da Amazônia – CIESA (Coordenação do Curso de Direito). Manaus, 07.06.2003.

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