Artigos - Prostituição e Crime de Exploração Sexual

10/ 12 /2014

Prostituição e Crime de Exploração Sexual

Grande preocupação do Poder Público é o aumento de delitos relacionados ao sexo, inclusive os mais usuais atualmente, como de pedofilia e de turismo sexual. Reflexos da pressão internacional, sobretudo decorrente da Convenção de Palermo, aceita pelo Brasil, as Leis 11.106/2005 e 12.015/2009 se revelaram firme empreitada legislativa de modernização e de atualização do Código Penal de 1940 quanto a tipos ultrapassados ou a bens jurídicos protegidos desatualizados ou inadequados para a sociedade atual. É o caso dos crimes contra os costumes previstos no Título VI do Código Penal que receberam outra compreensão ao serem tratados como delitos contra a dignidade sexual, entre os quais contra a liberdade e contra a autoderminação sexual.

A mudança de foco se estabeleceu, ademais, com o fim da exclusividade da mulher como vítima, sobretudo pela retirada deste inapropriado vocábulo legal: “mulher honesta”. Para o legislador do Código Penal reformado não apenas a mulher pode ser vítima de exploração sexual como também o homem pode ser vítima do crime de estupro (antes tratado como atentado violento ao pudor).

A atenção legislativa ao tráfico sexual possui inegavelmente a finalidade de desestimular a prostituição, conquanto por si só não a criminalize, uma vez que a prostituição em si não é crime. Procura-se com o art. 231 do Código Penal punir aquele que, de qualquer modo, mesmo não provado o intuito de lucro na conduta, estimule ou incentive de maneira decisiva a prostituição ou qualquer forma de exploração sexual. A vantagem econômica é apenas um fator de admissibilidade para a aplicação também da pena de multa, mas é raro que alguém pratique o delito de promover, facilitar, aliciar, arregimentar e comprar pessoa explorada se não estiver em jogo o lucro e a mercancia sexual.

O crime de migração internacional de exploração sexual tem como características a promoção e a facilitação da saída ou da entrada de alguém (não somente da mulher, como era antes) do e no Brasil a fim de exercer a prostituição ou atividade similar. Comete o delito, por exemplo, quem leva ou agencia uma pessoa para no estrangeiro se prostituir ou realizar filmes ou vídeos pornôs. Prevalente para a configuração do delito é a exploração sexual, sendo suas espécies a promoção e a facilitação de saída ou entrada do país para prostituição. O que pode levar à punição criminal é o fato de alguém promover, facilitar, aliciar ou incentivar outrem a sair ou a entrar no país para ser explorado sexualmente, não importando o consentimento da vítima, que, sendo vulnerável (tal como menor, portador de deficiência ou alguém que sofre violência), agrava a situação do agente, sujeitando-o à sanção penal majorada na metade da pena a ser aplicada originalmente pelo simples tráfico.

Segundo o Código Penal (art. 231-A) também comete o crime quem promove (facilita, alicia, incentiva, vende ou compra a pessoa) o deslocamento de alguém dentro do Brasil para o exercício de exploração sexual. Sem prejuízo de poder incorrer em outras modalidades criminosas (vide art. 218-B, § 2º, I, do CP), não comete o crime de tráfico interno o cliente em geral, o que contrata eventualmente os serviços sexuais, salvo se, para os fins do delito de tráfico, sua atitude configurar a compra da pessoa transportada para o exercício exclusivo da exploração sexual. Muito menos há infração penal se alguém se desloca dentro do país ou sai ou entra em contato por conta própria e diretamente com o consumidor dos serviços sexuais. Ou seja, o exercício da prostituição direta e imediata por pessoa maior e capaz não é crime, todavia a exploração da prostituição, a intervenção ou o agenciamento é delito a ser punido com no mínimo três (a oito) anos, em caso de transnacionalidade, e de no mínimo dois (a seis) anos em caso de deslocamento para exploração sexual interna, podendo haver aumento de sanção se a vítima é vulnerável. Aplica-se a pena de multa se com a intermediação da saída ou da entrada ou do deslocamento do território nacional o agente visa à vantagem econômica.

O Direito Penal procura reprimir quem explora ou constrange sexualmente uma pessoa (fazendo, por exemplo, da vítima uma escrava sexual, forçá-la à prostituição, enganá-la ou tolhê-la a liberdade), punindo ainda o rufião, o dono da casa de exploração sexual, o traficante de pessoas para exercício de prostituição no estrangeiro ou no Brasil, e o consumidor dos serviços sexuais de crianças e adolescentes, conforme diversas tipificações no nosso Código Penal, com o que se pode concluir que o legislador procurou fazer um cerco às diversas formas de exploração sexual. O avanço louvável na legislação evidencia uma situação peculiar:  apesar de consentir a prostituição de pessoas maiores e capazes, o legislador procura desestimulá-la ao criminalizar condutas penais que infrinjam a autoderminação, a liberdade e a dignidade humana e sexual.

 

Vallisney de Souza Oliveira. Publicado também no Informativo Consulex, n. 18/2012, de 30/04/2012 – Tema da Semana. Editora Consulex.

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